Mãe solo: A dor e alegria de ser

Por Vânia Eckhardt


Mães que criam sozinhas seus filhos são conhecidas respeitosamente como mães solo, sabemos que essa é a realidade de muitas mulheres brasileiras. Anteriormente essas mulheres recebiam o título de mãe solteira, o que era inapropriado porque não tem relação, muitas tem inclusive um parceiro, mas não pai do seu filho, e por isso lutam sozinha, sem dividir as questões da criança com aquele com quem deveria dividir, o pai biológico. Além disso, com toda a carga materna nas costas, muitas se consideram “mães solo”, mesmo com um companheiro ao lado. O termo mãe solo passou a dar visibilidade para essas tantas mulheres. O querido Papa Francisco afirmou recentemente que mãe solteira não é estado civil, num discurso que ecoou pelo mundo inteiro. Ora pai é pai e mãe é mãe solteira?! isso não é plausível. 

Vamos refletir sobre a mudança de nomenclatura do termo que embora fortaleça e potencialize as mães que criam seus filhos sozinhas não abrange os muitos desafios que permanecem, é certo que o termo agradou quem exerce a maternidade dessa forma e foi adotado com muito carinho pela comunidade materna. Mãe solo certamente é aquela mãe que cuida, alimenta, é responsável física, social, sentimental e financeiramente por aquela criança. 

De acordo com dados da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais nos primeiros quatro meses de 2022, o número de crianças registradas apenas com o nome da mãe na certidão de nascimento chegou a 56,9 mil. Em 2021, esse número era de 53,9 mil crianças. São quase 57 mil novas mães solo que lidarão com toda a carga materna. Infelizmente, o cenário de famílias sem a presença do pai é comum. São milhares de mães chefiando sozinhas os lares.

Eu enquanto mãe solo já escutei: você deveria escolher melhor a pessoa com quem teve sua filha, você devia ter se planejado melhor, a culpa é sua que não soube escolher. Porém cabe compreender que mãe não é obrigada a se manter em um relacionamento com o pai da criança só porque a sociedade espera uma família tradicionalmente estruturada. A estrutura familiar não precisa ser a tradicional, mesmo que o planejamento inicial tenha sido esse. À todos os casos de mães solo, não são cabíveis julgamentos sobre as escolhas que elas fizeram em relação a seus parceiros, pais da criança. Não é justo eu ser julgada pela minha escolha, mesmo porque os planos de uma vida feliz foram autênticos, desejei o melhor para a minha filha. Como as coisas saíram dos planos, assumi a função da mãe solo e lutei como uma verdadeira guerreira e hoje colho os frutos dessa opção. Minha filha está uma moça maravilhosa, universitária, me enche de orgulho, amiga e amorosa.

No meu caso, optei em não assumir novo relacionamento, visto que eu trabalhava muito para arcar com todos os gastos e cuidado com minha filha. Trabalhava manhã, tarde e noite, cuidava da casa, dava atenção pra ela, uma mãe atenciosa. Hoje morremos de rir quando lembramos das noites que eu me embolava nas palavras ao contar histórias de ninar de tanto cansaço.  Num momento fiquei internada por três dias por conta de uma estafa terrível. 

Segundo dados do IBGE, o Brasil tem 11 milhões de mães solo chefiando lares. Para ajudar financeiramente essas mulheres, em março, o Senado aprovou um projeto que cria a Lei dos Direitos da Mãe Solo. Na proposta, são englobadas as mulheres chefe e provedoras de família monoparental e com dependentes de até 18 anos. Pelo projeto, a mãe solo inscrita no Cadastro Único para Programa Sociais terá direito ao valor do benefício em dobro em qualquer programa assistencial de família com crianças e adolescentes, como o Auxílio Brasil. Se sancionado, a mãe solo também terá políticas públicas de qualificação e recolocação profissional, outras políticas públicas estão em andamento no cenário nacional.

A questão das mães solos no Brasil e no mundo perpassa também a questão da multi jornada de trabalho, imposta às mulheres a partir de um pensamento machista e misógino enraizado na nossa sociedade. Apesar dos muitos avanços em pautas feministas, ainda hoje é senso comum que tarefas domésticas são exclusivas delas, ou seja, além de trabalharem fora para sustentar a família sozinha, ao chegar em casa deparam-se com outros trabalhos, esses não assalariados, como cozinhar, limpar a casa, lavar e passar a roupa. São jornadas de trabalho silenciadas, mas que pesam na vida dessas mulheres. Momentos que deveriam ser voltados para o lazer e descanso são tomados por mais trabalhos, o que gera cada vez mais o desgaste físico e emocional daquela mãe. 

Hoje vejo que valeu a pena tudo que eu fiz em prol da criação da minha filha e, por isso, penso em trocar experiências, ouvir relatos, abrir espaços, dar voz a uma parcela dessas mães que são solo sim, que lutam contra as adversidades, que vencem seus medos e preocupações e que se dedicam ao seu bem maior, seus filhos.


 

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